A quantidade de contentamento que eu consigo tirar das coisas está em queda livre desde o início da minha adolescência. A cada ano que passa, tudo fica mais chato e difícil de ser feito, ao ponto de que me sinto profundamente estressado e frustrado com a mísera cogitação de realizar qualquer coisa, inclusive iniciar esse post. Lembra daquela sensação boa que tínhamos na infância, que geralmente precedia uma atividade prazerosa? Excitação, entusiasmo, ansiedade... não sei qual palavra define perfeitamente esse sentimento. Não sei se é um processo natural, mas isso foi sendo arrancado de mim aos poucos, até chegar no dia de hoje, onde o gozo e a intenção de permanecer vivo são residuais. A crescente certeza de que estou vagando nesse universo infinito pra absolutamente nada me traz uma sensação horripilante.
Obviamente, a sociedade em geral - e o show de horrores que o ocidente se tornou - também é um problema, porém muito menor se comparado à gigantesca sensação de falta de sentido. É claro que ter nascido na pele desse cara medíocre e fadado ao fracasso me intriga e incomoda bastante. A minha vida pessoal é uma piada de mau gosto em todos os sentidos e eu não estou contente com isso, mas não são essas coisas que me causam o constante nó na garganta e a completa sensação de desamparo. Aceitar (e até achar engraçado) que sou um perdedor não é algo tão difícil assim. Deixando isso tudo de lado e, analisando as coisas de fora da minha animalidade, eu só consigo entender que tudo ao meu redor (tudo mesmo, dos móveis da minha casa até corpos celestes a trilhões de anos-luz) é extremamente absurdo. A realidade é um absurdo. Não me entenda mal, TODOS os seres humanos estão na mesma condição, não estou aqui me achando único. A diferença é que com os outros eu não me importo (ui que malvado). Não é questão de querer ser malvado, porra, é só a simples conclusão lógica de que não tem como eu me importar verdadeiramente com algo que eu não sinto. Eu só sinto o que EU sinto. Cada um lida com a sua própria merda. Empatia é o meu pau.
As pessoas fogem desse vazio, matando o tempo e doando suas vidas para outras pessoas de várias maneiras diferentes. Religiosos, "baladeiros" (me dei um tapa na cara agora por ter escrito essa palavra de merda), pais de família, viciados em trabalho, altruístas, não importa. No fim das contas, todos estão vivendo em função de outros seres humanos. Provavelmente é isso que traz a sensação de sentido, apesar de não existir literalmente um sentido (afinal, o que importa são as nossas impressões, pois são elas que criam a sensação de realidade, e não a realidade objetiva em si). No fundo, o sentido não existe, mas, pra essas pessoas, a sensação de que há um sentido é real e faz toda a diferença.
Quanto mais você vive para os outros, menos compreende a si mesmo e, por consequência, menos sofre. Você vai perdendo o contato com seu "eu interior" e acaba adormecendo certas percepções. É exatamente por isso que pessoas "normais" têm um choque tão grande quando se deparam com esse tipo de pensamento existencialista. Nas pessoas normais, que conseguiram se encaixar no esquema, o interruptor que acende essas dúvidas foi sendo cuidadosamente inutilizado ao longo do tempo e, atualmente, encontra-se completamente enterrado em algum canto obscuro do subconsciente. É por isso que não adianta tentar abordar esses temas com essas pessoas. A única coisa que você vai receber em troca é incompreensão. Algumas pessoas de bom coração, ao entrar em contato com esse tipo de assunto, vão te oferecer a baboseira espiritual que fez sentido pra elas, num raciocínio inocentemente sincero, que funciona mais ou menos assim: "se X funcionou pra mim, vai funcionar pra você também!". Essas pessoas NUNCA param suas atividades pra simplesmente pensar na vida. Até pra isso criou-se uma palavra com um sentido específico: tédio. Quando essas ideias e questionamentos estranhos começam a pintar na superfície da consciência, logo tratam de "arrumar algo pra fazer". Tá aí a necessidade do ditado religioso "mente vazia, oficina do diabo". Quem criou esse ditado, tinha a noção de que o ato de parar pra pensar no sentido das coisas é perigosíssimo; um buraco sem saída.
A busca por uma resposta definitiva e objetiva acerca do propósito da existência é uma batalha PERDIDA. Eu não penso dessa maneira porque acho bonito ou porque me esforço para ter tais ideias, muito menos porque tenho algum tipo de esperança na obtenção de respostas. Infelizmente, minha consciência só sabe funcionar dessa maneira e eu não tenho escolha alguma. Eu SEI que estou fadado a questionar, sem sucesso, as MESMAS COISAS, até a hora da minha morte. Quero deixar isso bem claro, pois, algumas pessoas, se achando as obtentoras da sabedoria, tentam me fazer desistir dessas ideias, com conclusões "lógicas" dignas de jardim de infância, do tipo: "você nunca vai achar resposta pra essas coisas, logo, o melhor é desistir e parar de pensar nisso", como se eu tivesse algum tipo de opção. ACREDITE, SE TIVESSE COMO DESISTIR E PARAR DE PENSAR NISSO, EU JÁ TERIA FEITO.
É claro que existem milhões de """""respostas""""" por aí. Coloquei várias aspas pra deixar claro que não são respostas de verdade. São subterfúgios cuidadosamente (ou instintivamente, vai saber) criados para tornar a existência menos dolorosa. Já tentei me jogar de cabeça em vários escapismos travestidos de """""respostas""""", e tudo que consegui foi me sentir ainda mais minúsculo e patético. Se você tem a capacidade de ouvir sons emitidos pela boca de um primata (ou decodificar símbolos desenhados em folhas de papel [a.k.a. livros] por um primata) e, com isso, sentir-se tranquilo acerca da imensidão do universo, meus sinceros PARABÉNS. Aproveite essa dádiva. Sim, crenças religiosas não passam disso: pessoas SEM A MENOR PISTA de qualquer coisa, dizendo coisas que aliviam a existência de outras pessoas que também não tem a menor ideia do que estão fazendo vivas. Religiões só foram criadas porque a existência é injustificável. A existência de religiões é a prova de que nada faz sentido e nós precisamos de uma história mirabolante para nos sentirmos à vontade. Se existir não fosse por si só uma absurdidade, as religiões não teriam motivo de existir. Ou talvez seja verdade aquela história de que somos programados pra fazer parte de uma tribo com apenas 150 indivíduos, e a religião seja um modo de driblar essa limitação humana, nos fazendo viver confortavelmente entre milhões de pessoas (desde que todas estejam sob um mesmo conjunto de regras, daí a necessidade de uma religião). SEI LÁ PORRA.
Voltando à fútil e egocêntrica mania de me incomodar com acontecimentos da minha vida pessoal, vou falar aqui algumas coisas que costumavam me incomodar muito e que hoje incomodam pouco ou não incomodam nada. Ver a minha mãe se desdobrando, ao tentar driblar o fato de eu ser um peso morto, sempre me machucou demais. Ver o esforço dela em trabalhar, cozinhar, limpar tudo e voltar pro trabalho pra sustentar um mongol (eu) sempre foi um dos combustíveis pra minha tristeza. Existem várias outras coisas que não vou dizer aqui pois me exporiam demais, mas que sempre me deixaram mal. Hoje, eu ainda consigo reconhecer minhas incapacidades e falhas, mas sinto cada vez menos culpa por elas. Minhas falhas ocupam uma porcentagem cada vez menor no espectro de coisas que me fazem mal e, eventualmente, essa porcentagem chegará a zero. Outra coisa que me deixava bastante preocupado e deprimido, era pensar no meu futuro. O fato de eu não saber se eu conseguiria me tornar um profissional reconhecido, com um salário decente e, consequentemente, se teria uma casa e um carro decentes, eram coisas que tiravam minha paz.
Imagine uma régua com um metro de comprimento. Essa régua representa minhas preocupações. Antigamente, 50cm eram dedicados às coisas de cunho pessoal (medo do fracasso, faculdade, relacionamentos, emprego, família, lazer), e os outros 50cm se encarregavam de questionar a existência e todas essas besteiras filosóficas. De uns tempos pra cá, a parte que se preocupava com minha vida pessoal está diminuindo exponencialmente, dando lugar à total falta de sentido. Creio que apenas 10cm da régua imaginária continue se importando com a bolha social na qual estou metido.
Eu ainda faço várias coisas em prol do meu "futuro". Me dedico o suficiente na faculdade, faço musculação com uma disciplina que beira o impecável, entre outras coisas. Esses atos são totalmente conscientes e forçados. Eu tenho noção de que estou fazendo isso pra nada. A longo prazo, nada vai ser recompensado. Tudo vai acabar. Mesmo assim, eu ainda dou andamento à minha vida, pelo seguinte motivo: eu sei que ainda vou me tornar um mendigo e morro de medo disso.
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Eu atualizando o blog daqui a 20 anos |
Tenho a nítida impressão de que ainda chegará o dia em que meu senso de consequência terá se reduzido a uma mera lembrança. Não mais me importarei se estou limpo, vestido, alimentado ou sob um teto. Tenho muito medo de chegar a tal ponto, no qual minha única ocupação será pensar na tremenda loucura que é estar vivo.
Se atualmente eu não tenho controle de uma grande parte dos pensamentos que ocorrem em minha mente, quem me garante que, no futuro, esse descontrole não aumentará? Quem garante que eu sempre vou ter a decência e a força pra obrigar a mim mesmo a fazer certas atividades?
Uma coisa é certa: ter esse tipo de consciência requer um luxo que eu nem sempre terei. Não vou ser sustentado por outra pessoa pra sempre. Um dia, vou ter que me virar. Estou certo de que vou continuar sem coragem para cometer suicídio e, caso eu perca a capacidade de me forçar a fazer coisas que não quero fazer, a única saída será morar debaixo da ponte.
A cada segundo que passa, estou um segundo mais próximo do meu inevitável destino de morador de rua.
Até mais.
((((Esse texto não é um pedido de ajuda. Contenha seu impulso egomaníaco de tacar sua burrice nos comentários com uma pseudo-solução pros meus problemas. Sua opinião a respeito desse post é irrelevante))))